Dos Santos populares, aquele que tem para o povo da freguesia
de Sortelha maior significado e consegue gerar ainda um certo entusiasmo é o
São João.
Nos dias que o antecedem, era costume em Sortelha os rapazes
espetarem um mastro no centro do largo de São Gens, o qual era revestido com
rosmaninhos e outros adornos, como balões, bandeiras e recortes de papéis de
fantasia, que davam ao mastro uma certa graça, fazendo lembrar o São João.
Nessa noite, os rapazes costumavam organizar o tradicional
baile de São João, ao qual ocorria grande parte da população.
Por volta da meia-noite, deitava-se o fogo ao mastro e fazia-se
aquilo a que as pessoas chamam o “sarnadoiro” ou “sarnadouro”, que consiste em
saltar por cima das fogueiras enquanto os rosmaninhos ardem exalando no ar o
seu agradável e característico perfume. Atualmente, dada a falta de gente jovem
no nossa região, capaz de imprimir vida à noite de São João, por vezes em
substituição do mastro fazem-se aqui e ali pequenas fogueiras que, dentro de
uma certa crença, servem apenas para as pessoas se “sarnarem” acreditando que
assim ficam livres de certas doenças.
Na Quarta-Feira, as pessoas ao saltarem as fogueiras,
costumam entoar algumas rimas populares, que cada qual compõe no momento,
usando talvez um pouco da sua veia poética, tais como:
Sarnar em Valhelhas
Saúde para as orelhas
Sarnar em Água Belas
Saúde p’ ras minhas canelas.
Etc. etc..
Para além destas rimas da autoria das pessoas que vão
saltando, costumavam-se cantar algumas cantigas alusivas ao São João das quais se
destacam as seguintes:
Ai repenica, repenica, repenica,
Ai São João a suar em bica.
Ai repapoila, repapoila, repapoila,
Arroz-doce p’rá minha caçoila.
Ai orvalheiras, orvalheiras, orvalheiras,
Viva o rancho das mulheres solteiras.
Ai orvalhadas, orvalhadas, orvalhadas,
Viva o rancho das mulheres casadas.
Se fores ao São João
Trazei-me um São Joãozinho,
Se não puderes com ele mais grande,
Trazei-me um mais pequenino.
S. João p’ra ver as moças
Fez uma fonte de prata,
Mas as moças não vão lá
São João todo se mata.
Para animar mais a noite de festa, na Quarta-Feira era
costume pendurar-se um cântaro de barro no cimo do mastro, dentro do qual era
metido um gato tapado com rede, para não poder sair. Quando o fogo atingia o
cordel que segurava o cântaro, este caía no chão e ao partir-se, o gato “assanhado”
pelo barulho de alguns foguetes colocados no mastro, lançando no ar alguns “miaus”,
fugia meio chamuscado, provocando o riso geral.
Com pequenas variações de umas anexas para as outras é assim,
dum modo geral, que se celebravam e celebram as festas de São João na freguesia
de Sortelha.
Relativamente ao São Pedro, embora não seja festejado actualmente,
teve noutros tempos um papel de relevo nas mentes das gentes da freguesia de
Sortelha, por estar ligado aos prazos de contratos estabelecidos entre patrões
e criados.
Os contratos que fossem respeitantes ao ano todo ou apenas a
alguns meses, terminavam quase sempre no dia de São Pedro, mesmo para os
criados que estivessem vários anos na mesma casa.
Durante o período de contrato, os criados não tinham direito
a pedir aumento de ordenado, mas logo que chegasse o dia de São Pedro, o criado
podia pedir aumento e em caso de não chegar a acordo com o patrão, ficava livre
para procurar outro.
Estes contratos eram sempre verbais, mas nem por isso tinham
menos validade, pois salvo raras exceções, qualquer das partes respeitava
integralmente o que tinha sido acordado.
Os criados que na véspera da feira de São Pedro, que ainda
hoje se realiza no Sabugal, não chegassem a acordo com os patrões, nesse dia
iam à feira, local onde os criados que tivessem deixado os patrões e os
proprietários rurais que precisassem deles se encontravam para negociarem os
seus contratos.
Alguns pastores, para serem identificados apresentavam-se a
tocar flautas, consideradas instrumentos típicos da profissão e traziam às
costas chocalhos e campainhas, “loiça” que era propriedade sua e por isso
haviam retirado dos rebanhos dos anteriores patrões.
Os ganhões apresentavam-se com grandes varas, geralmente de
castanho, freixo ou salgueiro, providas de picos na ponta , a que na
Quarta-Feira se dá o nome de ferrão, consideradas emblemáticas daquela
profissão.
A atestar a importância que o São Pedro tinha nas mentes das
nossas gentes, relativamente aos contratos celebrados entre patrões e criados,
está o facto ainda actual, de em jeito de brincadeira, se perguntar em véspera
da feira à vizinha ou pessoa de relação corrente, se está contente com o patrão
ou se vai ao São Pedro para “arranjar” outro novo e o mesmo se pergunta também
aos homens se vão ou não mudar de patroa.
A resposta é geralmente esta ou outra semelhante: - Já pensei
em mudar mas tenho medo de ficar pior.
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