segunda-feira, 14 de março de 2011

Poesia de António Aleixo para Quartafeirense ler

Vós que lá do vosso Império   
prometeis um mundo novo,
calai-vos, que pode o povo
qu'rer um Mundo novo a sério



Que importa perder a vida
em luta contra a traição,
se a Razão mesmo vencida,
não deixa de ser Razão

Uma mosca sem valor
Poisa c'o a mesma alegria
na careca de um doutor
como em qualquer porcaria.

P'ra mentira ser segura
e atingir profundidade
tem de trazer à mistura
qualquer coisa de verdade.

Julgando um dever cumprir,
Sem descer no meu critério,
Digo verdades a rir
Aos que me mentem a sério!

Há luta por mil doutrinas.
Se querem que o mundo ande,
Façam das mil pequeninas
Uma só doutrina grande.

Sei que pareço um ladrão...
mas há muitos que eu conheço
que, sem parecer o que são,
são aquilo que eu pareço. 

Sem que discurso eu pedisse,
ele falou, e eu escutei.
Gostei do que ele não disse;
do que disse não gostei. 

O mundo só pode ser
melhor do que até aqui,
quando consigas fazer
mais p'los outros que por tí!
 


Veste bem, já reparaste?
mas ele próprio ignora
que, por dentro, é um contraste
com o que mostra por fora.

Eu não sei porque razão
certos homens, a meu ver,
quanto mais pequenos são
maiores querem parecer.
  

Nas quadras que a gente vê,
quase sempre o mais bonito
está guardado pr'a quem lê
o que lá não está escrito.
  

Vemos gente bem vestida,
No aspecto desassombrada;
São tudo ilusões da vida,
Tudo é miséria dourada.

Os novos que se envaidecem
Pelo muito que querem ser
São frutos bons que apodrecem
Mal começam a nascer.
  

Para triunfar depressa
cala contigo o que vejas
finge que não te interessa
aquilo que mais desejas.

Os que bons conselhos dão
ás vezes fazem-me rir
por ver que eles mesmos, são
incapazes de os seguir.

Eu não tenho vistas largas
Nem grande sabedoria
Mas dão-me as horas amargas
Lições de Filosofia.

Quem nada tem, nada come;
E ao pé de quem tem de comer,
Se alguém disser que tem fome,
Comete um crime, sem querer.

A quadra tem pouco espaço
Mas eu fico satisfeito
Quando numa quadra faço
Alguma coisa com jeito.

Mentiu com habilidade,
fez quantas mentiras quis,
Agora fala verdade,
ninguém crê no que ele diz.

Embora os meus olhos sejam,
os mais pequenos do Mundo
O que importa é que eles vejam
O que os homens são no fundo.

É fácil a qualquer cão
Tirar cordeiros da relva.
Tirar a presa ao leão
É difícil nesta selva.

Quando os Homens se convençam
Que à força nada se faz,
Serão felizes os que pensam
Num mundo de amor e paz.


Tu, que tanto prometeste
enquanto nada podias,
hoje que podes -- esqueceste
tudo o que prometias... 

O meu merceeiro é um santo
e há quem diga que ele é mau!
Digo-lhe só: -- dou mais tanto,
já me arranja bacalhau.

Não sou esperto nem bruto
Nem bem nem mal educado;
Sou simplesmente o produto
Do meio em que fui criado.

Quem me vê dirá: não presta,
nem mesmo quando lhe fale,
porque ninguém traz na testa
o selo de quanto vale. 

Muito contra o meu desejo,
sem lhe querer dizer porquê,
finjo sempre que não vejo
quem finge que me não vê...

Diz que viver é sofrer ...
concordo. Mas não compreendo
que ninguem ouse dizer
que se aprende sofrendo.


À guerra não ligues meia,
Porque alguns grandes da terra,
Vendo a guerra em terra alheia,
Não querem que acabe a guerra.

Se os homens chegam a ver
Por que razão se consomem,
O homem deixa de ser
O lobo do outro homem.


Por que a vida me empurrou
caí na lama, e então...
tomei-lhe a cor, mas não sou
a lama que muitos são.

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